
Mercado de Carbono: Será uma oportunidade verde para Angola?
Mercado de Carbono: Uma Oportunidade Verde para Angola? O mercado de carbono funciona como uma “conta bancária” ambiental quem captura CO₂ gera créditos, quem polui paga. Criado a partir da teoria de Ronald Coase nos anos 60 e consolidado pelo Protocolo de Kyoto em 1997, já movimenta bilhões em todo o mundo.
Irocy Gonçalves
8/5/20255 min read


Imagine que a atmosfera é como uma conta bancária planetária, onde cada tonelada de CO₂ emitida é um "débito" e cada tonelada capturada é um "crédito". O mercado de carbono funciona exatamente assim: quem "deposita" mais carbono na natureza pode vender esses "créditos" para quem ainda está "gastando" demais.
A ideia do mercado de carbono nasceu em 1960 com o economista Ronald Coase, da Universidade de Chicago, que propôs que a poluição deveria ter um custo de produção. Sua teoria era simples: se cobrássemos taxas sobre a poluição, o próprio mercado se autorregularia.
O primeiro experimento ocorreu em 1976 nos EUA, onde empresas podiam construir fábricas poluentes em algumas regiões, compensando com menor poluição em outras. Resultado? A poluição não diminuiu, apenas se espalhou.
O marco definitivo veio com o Protocolo de Kyoto em 1997, que estabeleceu o primeiro sistema global de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. A ideia: países que emitissem menos CO₂ que o permitido poderiam vender esse "saldo positivo" para nações que ainda não conseguiam cumprir suas metas.


Dados alarmantes que motivaram a acção:
CO₂ representa 70% das emissões de gases de efeito estufa
Concentração actual: 418 ppm (2022) - aumento de 50% desde a Revolução Industrial
Meta urgente: Reduzir emissões em 43% até 2030
Investimento necessário: 100-150 trilhões de dólares nas próximas três décadas
Como funciona o mercado de carbono na prática?
O mercado de carbono opera em um princípio simples: não importa quem reduz as emissões, desde que elas sejam reduzidas globalmente.
Imagine a atmosfera como uma piscina gigante. Se uma pessoa despeja 10 baldes de água suja (emissões) e outra retira 10 baldes de água limpa (captura de carbono), o resultado líquido é zero para a piscina. O mercado permite que quem "despeja" pague quem "retira".
Os Protagonistas do Mercado:
Geradores de Créditos: Projectos de reflorestamento, energia solar, agricultura regenerativa, Carros Eléctricos.
Compradores: Empresas que precisam compensar suas emissões.
Intermediários: Empresas que validam, certificam e facilitam as transações.
Reguladores: Organismos que estabelecem regras e padrões.
Mercados Regulamentados vs. Voluntários
Mercado Regulamentado (Compliance)
Obrigatório por lei em certas regiões
Governos estabelecem limites máximos de emissão (cap)
Empresas devem comprar créditos se excederem os limites
Exemplos: Sistema Europeu (€96,30/tonelada CO₂), China (US$8,15/tonelada CO₂)
Primeira negociação: União Europeia em 2005
Mercado Voluntário
Empresas escolhem participar por responsabilidade corporativa
Não há obrigação legal
Motivado por pressão de consumidores e stakeholders
Padrões: VCS (Verified Carbon Standard), Gold Standard
Compradores: Qualquer organização ou indivíduo via plataforma da ONU
Curiosidade: O maior sistema regulamentado é da China (2021), cobrindo 14% das emissões globais!
As Duas Faces da Moeda: Vantagens e Desvantagens
Vantagens do Mercado de Carbono:
Incentivo econômico para projectos sustentáveis
Flexibilidade para empresas cumprirem metas climáticas
Geração de receita para comunidades rurais e países em desenvolvimento
Aceleração da transição energética global
Desvantagens e Críticas:
"Licença para poluir": Empresas podem continuar poluir pagar compensações
Medição imprecisa: Quantificar carbono capturado não é ciência exata
Custos elevados: Validação representa 75% do custo de geração dos créditos
Permanência incerta: Quem garante que o carbono ficará retido por 100 anos?
Potencial para fraudes: Projectos sem validação científica adequada
Deslocamento de problemas: Poluição pode apenas mudar de local
Angola no Mercado de Carbono: Realidade Actual
PROTOCOLO DE KYOTO - 1997
FONTE - Televisão Pública de Angola


FONTE: Televisão Pública de Angola
Angola NÃO possui um mercado regulamentado de carbono, mas participa do sistema através do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Kyoto.
Marco Institucional:
Autoridade Nacional Designada: Criada pelo Decreto 2/10, tutelada pelo Ministério do Ambiente
Função: Avaliar propostas nacionais de projectos para o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
Projecto Pioneiro - Barragem do Gove:
Em 2014, Angola teve seu primeiro projecto autorizado:
Localização: Província do Huambo
Potencial: Redução de 126 mil toneladas de CO₂/ano por 10 anos
Status: Créditos comercializáveis mundialmente
Impacto: Melhoria da qualidade de vida local e financiamento sustentável
Potencial Futuro:
Recursos Naturais Abundantes:
Florestas extensas (Maiombe e outras regiões)
Alto potencial solar e eólico
Terras para agricultura regenerativa
Projectos hidroelétricos
Sectores Prioritários:
Energia: Substituição de combustíveis fósseis
Agricultura: Práticas de sequestro de carbono no solo
Florestas: Conservação e reflorestamento
Indústria: Eficiência energética e tecnologias limpas
Desafios Estruturais:
Marco regulatório limitado: Ausência de legislação específica
Capacitação técnica insuficiente: Poucos especialistas locais
Investimento em climate techs: Necessidade de startups sustentáveis
Monitoramento e verificação: Sistemas para medir capturas de carbono.
Casos de Sucesso Inspiradores
Tesla: A empresa de Elon Musk faturou 438 milhões de dólares em 2021 apenas vendendo créditos de carbono de seus carros elétricos.


Microsoft: Comprometeu-se a ser "carbono negativa" até 2030, comprando 200 mil créditos de fazendas regenerativas e planejando comprar 6 milhões anuais.


Brasil: A Camil Alimentos S/A foi pioneira, vendendo 1 milhão de euros em créditos gerados pela queima de casca de arroz para energia.


FONTE - RELATÓRIO DE SUSTENTABILIDADE CAMIL 2022
Por Que Angola Deve Agir Estrategicamente
Mercado em Expansão: Projeção de 100 bilhões de dólares anuais até 2050
Diversificação Econômica: Redução da dependência do petróleo
Precedente Positivo: Barragem do Gove já gera 126 mil toneladas CO₂/ano
Desenvolvimento Rural: Renda adicional para comunidades
Vantagem Competitiva: Recursos naturais abundantes vs. países sem florestas
Mas Angola deve estar ciente dos riscos e desenvolver marcos regulatórios robustos para evitar projetos fraudulentos e garantir benefícios reais para as comunidades locais.
Como Você Pode Participar
Para Jovens e Estudantes:
Especialize-se em sustentabilidade e gestão ambiental
Aprenda sobre medição de carbono e certificações
Desenvolva projetos locais de captura de carbono
Para Empreendedores:
Explore oportunidades em consultoria ambiental
Desenvolva tecnologias de monitoramento
Crie projetos comunitários de reflorestamento
Para Organizações
Implementem práticas sustentáveis
Meçam e reduzam pegadas de carbono
Apoiem projetos locais de carbono
O mercado de carbono é uma ferramenta importante, mas não é a solução mágica para as mudanças climáticas. É fundamental que Angola desenvolva uma abordagem equilibrada: aproveitar as oportunidades econômicas enquanto constrói marcos regulatórios sólidos e prioriza reduções reais de emissões.
A pergunta não é apenas se devemos participar, mas COMO podemos participar de forma inteligente e sustentável.
